quarta-feira, 30 de abril de 2014

FAROESTE POP

Assistam a dois curtas muito bacanas que misturam a tradição do western com linguagem pop. Invenções do paulista Edson Oda (www.edsonoda.com/).

O primeiro é The Writer (2012), uma fotonovela metalinguística, que nos faz a seguinte pergunta: quem manda numa narrativa, o autor ou o personagem?

O curta foi o vencedor de um concurso internacional para promover o filme Django Livre, sendo escolhido pelo próprio Tarantino.



O segundo curta é Malaria, sobre um cowboy que é contratado para matar a Morte. Também foi vencedor de vários prêmios em 2013.




terça-feira, 29 de abril de 2014

MÁQUINA DO TEMPO MADE IN CHINA (POEMA)



                        Viagem no tempo é impossível
                         no espaço-tempo, quem sabe
                         para encontrar-me
                         em outra versão
                         radical
                         oriental
                         orientada
                         a tornar a máquina de Wells
                         made in China

segunda-feira, 28 de abril de 2014

A ARTE DE PÉRICLES JÚNIOR

Péricles Júnior é carioca e, como outros ilustradores brasileiros de grande talento, começa a fazer uma carreira internacional, apesar de já ralar nos quadrinhos e nas ilustrações há muitos anos.

Ele ilustrou uma estória da revista Pacific Rim: Tales from Year Zero, que serviu de prelúdio para o filme.

Site do PJ Canhota, como ele é conhecido no meio (http://pjarts.net/)








RESENHA DE SELVA BRASIL

E se o presidente Jânio Quadros, no início dos anos 1960, resolvesse invadir as Guianas, formadas pela Guiana (na época de dominação inglesa), Guiana Francesa e Suriname (de dominação holandesa), numa reivindicação por territórios?

Na imaginação do escritor Roberto de Sousa Causo, resultaria em um "Vietnã brasileiro".

Décadas depois de deflagrado o conflito, duas forças se opõem: de um lado, Inglaterra, França e Holanda, diretamente atingidos em seus interesses, apoiados pelos EUA; de outro, Brasil, Argentina e outros países sul-americanos, formando uma coalizão de resistência.

A guerra acabou se tornando um motivo para os países europeus e os EUA avançarem e se apossarem de parte de nossa Amazônia.

O narrador, um sargento do exército brasileiro, nos anos 1990, relata o cotidiano de seu pelotão pela selva, em luta contra a guerrilha patrocinada pelos países ricos.

Roberto de Sousa Causo
O narrador consegue nos conquistar.  Ele é um homem consciente de seu papel no conflito, alguém que tem de tomar decisões práticas muito sérias, do tipo quem vive e quem morre. Mas que também possui seus questionamentos e dilemas sobre quem ele é, qual o real propósito de suas ações.

O conhecimento do autor da vida de caserna (ele serviu o Exército na juventude) dá uma maior verossimilhança ao personagem.

Já a parte problemática da narrativa fica por conta do coloquialismo utilizado. Muitas vezes, não facilita a leitura, com uma linguagem muito próxima da fala oral. Compromete a fluidez da leitura, o estranhamento se torna constante. E o contexto mais geral desse Brasil alternativo não é muito explorado. O foco fica mesmo ali na selva. Referências externas são apenas rapidamente mencionadas.

Mas a força do protagonista como narrador faz com que a gente se envolva com a trama. Até o clímax cheio de ação.

A edição da Draco está caprichada. A capa é uma das mais bonitas lançadas pela editora. O texto está muito bem cuidado, descontando-se os "erros" de português propositais do autor. Além de um glossário com termos militares. A nota e o posfácio fazem parte de outro atrativo da narrativa. Não vou estragar a surpresa. Apenas digo que tem a ver com um jogo metalinguístico interessante. Deu mais relevância ao livro como ficção-científica e como instrumento de reflexão.

Selva Brasil, de Roberto de Sousa Causo, editora Draco

AVALIAÇÃO: BOM

sábado, 26 de abril de 2014

POR QUE NÃO SE LÊ NO BRASIL

Luciana Villas-Boas esteve a frente do maior grupo editorial do país por 17 anos. Agora, dedica-se à carreira de agenciamento e consultoria literária. Nesta entrevista, ela conta sobre a sua trajetória e sobre alguns fatos marcantes do nosso mercado editorial. (Aventura de Ler)

Também vale a pena conferir o artigo dela publicado na Folha de S.Paulo sobre o tema. 






sexta-feira, 25 de abril de 2014

ULISSES (CONTO)


Imaginei que fosse engano ou um golpe, uma maneira de entrarem no prédio, no meu apartamento e praticarem algum tipo de horror. Fiquei em silêncio depois do brevíssimo interrogatório. A contradição entre a voz muito jovem e a convicção de quem falava me deixou com medo, confuso, hesitante. E também, claro, havia o conteúdo de suas palavras: ele procurava por mim, exatamente. Na dúvida, resolvi não responder mais nada. Fiquei em silêncio e não tirei os olhos do cadarço do meu tênis, mal-amarrado, prestes a se soltar. Do outro lado do interfone, o cara arriscou um: ainda está aí? Então ele disse o nome do meu irmão. Ele perguntou se eu era o irmão mais novo. Não fiquei mais aliviado em ouvir essas informações da boca de um estranho. Pelo contrário. Essa certa intimidade fora de lugar me fez ficar mais desconfiado. A agonia crescente por não saber como agir causou em minha respiração um curto-circuito. Meu peito estufou rápido, mas nenhum ar entrou nos meus pulmões, e apertou-se e uma leve vertigem me obrigou a pender para o lado, e eu à procura do apoio de uma parede ou da mesinha de fórmica da cozinha para não me estatelar no chão. Tudo acontecendo e eu só pensava numa coisa: preciso tossir, tossir. Consegui dar dois passos aflitos, o cadarço do meu tênis desamarrou de vez e quase provocou uma tragédia, e me segurei na lateral da entrada da cozinha. A primeira tosse deu-se violenta, assim como a segunda. Me senti inchado e meus olhos se encheram de lágrimas. Recuperando o fôlego, a consciência de tudo em volta, o contexto da situação com o cara, me senti tão vulnerável, diminuído. Aquilo me enfureceu. Era como se eu estivesse à mercê de um trombadinha. Quando alguém se depara com uma figura dessas, perigosa, sem dúvida, mas tão sem recursos, tão miserável, a posição de vítima pode causar na pessoa uma revolta, por ter de se render a tão pouco. Então um sentimento de fúria emerge e te estimula a cometer uma reação descabida, burra. Pois foi o que fiz. Segurando os azulejos da entrada da cozinha, levantei o corpo, levantei a cabeça em direção ao teto e estiquei minha coluna até ouvir os estalos. Enfrentar. Minha disposição meio cega era de enfrentar. Meu batimento cardíaco desacelerava, mas parecia não querer voltar ao normal, teimando em permanecer um tanto acima da média. Num movimento de raiva, peguei minha perna e arranquei com as duas mãos o tênis desamarrado. Depois peguei minha outra perna e arranquei com as duas mãos o tênis amarrado. Meu corpo equilibrou-se dignamente. Fiquei muito orgulhoso. Ganhei ânimo para cometer minha loucura. Loucura mesmo. A voz do cara era muito jovem, mas não tão jovem para considerá-lo um trombadinha, para que o perigo se mostrasse tão miserável. Aquele era um perigo sem rosto, portanto, sem dimensão. Coloquei os chinelos, abri e fechei a porta da rua e fui descendo as escadas. A fome voltava a incomodar. Ela dera uma trégua durante todo o aperto que eu passara. Mas o que me deixava mais inquieto era a dúvida se eu encontraria ou não o cara lá embaixo. Depois que ele falou comigo, quis saber de mim, e a partir do meu voto de silêncio, eu o ignorei completamente. Eu estava mais interessado em descobrir o que fazer com meu medo, se eu iria entregar-me ou superá-lo. Eu ouvia a voz no interfone, mas não entendia direito o que o cara falava. Ou não queria entender. Até ontem pela manhã, antes de o cara surgir, toda vez que uma pessoa acionava o interfone, à minha procura, deixava bem claro desde o início o que queria, o seu propósito. Fosse um amigo inconveniente que estava por perto e resolvesse fazer uma visita. Fosse um religioso tentando pregar a palavra do senhor e oferecendo leituras de apoio espiritual. Fosse o entregador de uma pizza que eu torcia para que ainda estivesse quente. Fosse o carteiro trazendo alguma correspondência registrada que eu tinha de receber em mãos e assinar. Fosse um vendedor de porta em porta anunciando produtos inúteis de qualidade suspeita. Nada de enganos, muito menos golpes. Assim acontecia havia quase um ano, desde que eu alugara o apartamento. É até meio bizarro. Ser importunado apenas com motivo certo, preestabelecido. Eu já tinha me acostumado a essa realidade. E enquanto eu descia aquelas escadas, continuei a pensar o seguinte: e se a situação com o cara não tivesse nada de novo, fosse mais do mesmo? O coração batendo fora de ritmo queria acelerar um pouco mais. Então a situação poderia ter sido resolvida como em todas as outras, em caso de estranhos? Bastaria a simples recusa a qualquer pedido ou oferta do cara, ou minha descida corriqueira para receber o pacote registrado ou a pizza? Foi aí que a ficha do tamanho de uma tampa de bueiro caiu. Tardia e estupidamente percebi o óbvio, o muito óbvio. A menção ao nome do meu irmão me desestabilizara. Uma armadilha tão velha e conhecida que não devia mais me atingir. Essa minha desatenção para muitas coisas tão na cara sempre o irritou. Certa vez, ele me disse que minha falta de sincronia com o mundo me custaria muito caro algum dia, seria uma fonte de tristeza insuportável, não sabia se para outros, mas com certeza para mim. Quando ele me disse isso, exatamente com essas palavras, eu tinha catorze anos. Ele, dezessete. Nos anos seguintes, sua afirmação cresceu em significado ao me render aos autores que fui descobrir na adolescência: acima de tudo romancistas e contistas, acima de tudo os que tratavam a vida como um campo de batalha, cheio de tédio, frustração, violência e de poucos prazeres nos intervalos, prazeres fugazes, mas suficientes para serem superestimados, endeusados. Mas então quer dizer que minha performance de desespero, a dor do meu corpo perante o cara, ou melhor, perante a voz do cara, não se justificava? Eu não estava nem um pouco convencido disso. Por fim, cheguei ao térreo para ver do que esse cara era feito. Mas acontece que não havia ninguém lá.                          

ENTRE A CALMA E A FÚRIA

Explosões vulcânicas, lulas fosforescentes, vaga-lumes e a costa japonesa são alguns dos temas retratados pelo fotógrafo Takehito Miyatake.
Seu trabalho se baseia na rica tradição da arte naturalista japonesa.
Com as fotografias, ele se propõe a revelar a conexão entre a terra, a água e o céu do seu país. (BBC Brasil)