domingo, 31 de agosto de 2014

RESENHA DE O ÚLTIMO PORTAL, DE ELIANA MARTINS E ROSANA RIOS



A literatura infanto-juvenil nacional tem tradição. Ao longo do século 20, autores como Monteiro Lobato, Dinah Silveira de Queiroz, José Mauro de Vasconcelos, Ruth Rocha, Ana Maria Machado, Pedro Bandeira e Marcos Rey foram best-sellers escrevendo para jovens estórias que estimulavam o senso de aventura, em tramas ora mais inocentes, ora mais difíceis, tratando de temas como a importância da amizade, a violência urbana e o tráfico de drogas.

A partir dos anos 2000, com o surgimento de Harry Potter e similares, a ficção para jovens ganhou um enorme impulso no mercado editorial em todo o mundo. No Brasil, não foi diferente. Por aqui, houve autores que quiseram tirar uma lasquinha da onda e publicaram séries muito coladas ao fenômeno do bruxinho órfão, sem muita originalidade.

Quem conseguiu fugir da mesmice foram as autoras Eliana Martins e Rosana Rios, criadoras da série O Segredo das Pedras.

Composta por três romances e uma peça de teatro, a série começa, em seu primeiro volume O Último Portal, com o desaparecimento de um famoso geólogo brasileiro, envolvido em pesquisas misteriosas sobre um possível mundo subterrâneo. Mundo este que estaria ligado à humanidade, influenciando muitas de nossas referências culturais ao longo da História. Dara, uma menina colecionadora de pedras, Caio, um fã de futebol, e Safira, uma veterinária que “fala” com os animais, são jogados em meio a essa aventura cheia de segredos a serem desvendados e muitos perigos.

O infanto-juvenil nacional sempre teve grande inserção na vida escolar. O que sempre gerou um certo “efeito colateral”, uma ojeriza à leitura por parte de muitos jovens. A leitura se tornava uma obrigação. Porém a leitura por prazer era um hábito antigo entre os jovens brasileiros, que foi perdendo força ao longo das décadas.

Nos últimos quinze anos, a leitura espontânea entre jovens vem ganhando corpo novamente, seja de autores estrangeiros, seja de autores nacionais. A virada se deve ao fato de livros e séries terem protagonistas com ideias e comportamentos muito próximos de seus leitores, de seus fãs. São protagonistas que vivem grandes aventuras, mas que ainda assim são inseguros, falhos e que desconhecem suas próprias qualidades.

A literatura infanto-juvenil nacional amadureceu por tratar o jovem de forma mais complexa. Nossos autores do passado divertiam, mas eram raros aqueles que entendiam o jovem.

No caso de O Último Portal, suas autoras conseguem fazer isso em parte.

A maior qualidade do livro é o texto em si. Ele é muito bem escrito. A palavra certa sempre no lugar certo. Pena que a construção dos personagens não acompanha essa excelência. Tantos os protagonistas como coadjuvantes e vilões não têm o pathos necessário para que o leitor se importe com eles. Lemos o desenrolar da trama sem maiores expectativas. Queremos ver como termina a estória não para saber do destino de cada um, mas para confirmar se as autoras encerram esse primeiro volume de maneira satisfatória ou não, para ter uma ideia do todo.

Outra qualidade da obra é o cuidado na criação da mitologia da série, envolvendo vários aspectos do “mundo mineral”. Foi elaborada até uma língua do mundo subterrâneo, com direito a glossário. Além de expandir o escopo da trama para outros países e culturas. Afinal, se algo tão grandioso acontecesse apenas em um único país, apenas no Brasil, não teria o mesmo efeito.

Quero ler os outros volumes da série, na esperança de que ela evolua, de que os próximos livros sejam excelentes em todos os aspectos.

O Último Portal, de Eliana Martins e Rosana Rios, 272 págs., Cia das Letras.

AVALIAÇÃO: BOM.

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