domingo, 19 de abril de 2015

CADÊ O PROTAGONISTA NEGRO NA LITERATURA BRASILEIRA?


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A falta de um maior protagonismo de personagens negros na literatura brasileira foi algo que sempre me incomodou. Há exemplos desse protagonismo desde o século 19, quando estereótipos eram reforçados, como nos romances naturalistas. Nas primeiras décadas do século 20, a obra do fundamental Lima Barreto criticou esses estereótipos com toda a força.

No século 20, ao invés de a coisa evoluir, continuou praticamente no mesmo curso. Para cada João Antônio, tínhamos 10 Jorge Amado. Não estou faltando com o respeito com meu conterrâneo. Jorge Amado foi importantíssimo na minha formação como leitor e escritor. Ele me mostrou que era possível fazer boa literatura de forma simples, com energia, com alma. O grande problema de sua obra é que reduziu a Bahia e as peculiaridades de nossa cultura a um mundo pitoresco demais. Sem uma autocrítica desse mundo que realmente tocasse na ferida. Mesmo nos romances políticos, a revolta dos personagens negros sempre ia até certo limite. Nos livros de Lima Barreto, os personagens negros e mulatos passam desse limite e pagam o preço, e toda a brutalidade e hipocrisia sociais são expostas.

O que vimos na literatura brasileira no século 20 foi autores brancos mostrando como protagonistas negros se comportam, com maior ou menor competência. Enquanto isso, autores negros americanos, como James Baldwin, Richard Wright, Alice Walker e Toni Morrison, colocavam fogo no mundo literário dos EUA. Então eu pergunto: qual é o grande romance da literatura brasileira escrito por um autor negro no século 20? Sem pensar muito: Triste Fim de Policárpio Quaresma, de Lima Barreto. E só. Se eu tirasse o termo "por um autor negro", rapidamente lembraríamos de vários clássicos: Grande Sertão, Veredas; Vidas Secas; O Tempo e o Vento e por aí vai. Todos de autores considerados brancos.

Minha ponta de esperança é que autores negros, no século 21, estão tentando tirar esse nosso atraso, no dente. Autores como Ana Maria Gonçalves e Jim Anotsu.

Sinto falta em nossa literatura de romances policiais, fantasia, ficção-científica, chick lit e obras experimentais com protagonistas negros. Mas não apenas numa mera mudança de posição. E sim a representatividade com conteúdo. Colocar um personagem negro apenas como o mais bonito, o mais inteligente e o mais capaz é outra forma de racismo. Um personagem negro pode ser tudo isso, mas também deve ter os seus demônios interiores, como qualquer pessoa.

Autores negros, escrevam suas obras! Não estou dizendo aqui que autores brancos não podem escrever estórias com personagens negros. Estou dizendo que o autor negro, mais do que qualquer outro, sabe da urgência da representatividade em nossa literatura.

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